Por Alê Barreto *
alebarreto@gmail.com
Recebi via e-mail o link para a reportagem "Jason Fried:" É difícil trabalhar no local de trabalho", publicada na revista Época (leia na íntegra).
Segundo a matéria, Jason Fried é
"(...) dono da 37 Signals, uma empresa que desenvolve aplicativos para a internet e tem mais de 3 milhões de clientes. Escritor e blogueiro (37signals.com/svn), Fried colocou algumas das filosofias que usa na empresa em seu segundo livro, Rework (Retrabalhe, em tradução livre), escrito em parceria com seu sócio, David Heinemeier. Para eles, é imperativo haver uma mudança radical no modelo de gestão de empresas e no método de trabalho. “Não nos deixam trabalhar no trabalho”, diz Jason Fried nesta entrevista a ÉPOCA. “Os locais de trabalho são baseados na interrupção, e a interrupção é a maior inimiga da produtividade e da criatividade.”
Li a entrevista. Gostei muito. Transcrevo um pequeno trecho que me chamou atenção:
[início da transcrição]
ÉPOCA – O que há de errado no método de trabalho da maioria das empresas?
Jason Fried – Há vários erros no modelo de gestão de empresas e de funcionários. Definir prioridades o tempo inteiro é um deles: tudo parece prioritário; logo, nada tem prioridade. O planejamento é outro ponto falho. Planejar é ótimo quando ocorre de fato. Muitas vezes esse planejamento é puro achismo: ideias abstratas baseadas em premissas desconhecidas e pressupostos que não sabemos se vão ocorrer ou não. Mas, para mim, o principal problema é a forma como trabalhamos e os locais para fazer isso. É difícil trabalhar no trabalho. Não nos deixam.
ÉPOCA – Como assim?
Fried – O escritório, ou como queira chamar o local de trabalho comum, está repleto de interrupções. Se você fizer uma rápida pesquisa com seus colegas, vai perceber que a maioria prefere executar as tarefas pendentes de manhã cedo ou tarde da noite. Ou levar trabalho para casa, nos fins de semana. Esse não é o melhor jeito de trabalhar. Não se trata de uma questão de preferência dos funcionários. É uma decorrência do erro na estrutura dos locais onde trabalham.
ÉPOCA – Mas as pessoas produzem, não?
Fried – As pessoas trabalhariam melhor se não fossem interrompidas. A interrupção é a maior inimiga da produtividade e da criatividade. O modo de trabalhar acaba se adaptando à interrupção. Colegas falam, riem, andam de lá para cá, telefones tocam, chefes convocam reuniões o tempo inteiro. Em vez de uma jornada de trabalho, temos momentos de trabalho ao longo do dia. Você chega, liga o computador e tem uma reunião em 50 minutos. É um momento de trabalho. Depois da reunião, você volta irritado porque a reunião foi perda de tempo e vai almoçar. Na volta, passeia na rede social, conversa com um colega sobre algo banal, outro o chama para ver um vídeo no YouTube... De repente, são 5 da tarde e você não fez nada do que precisava. É assim que as empresas funcionam hoje, não importa em qual ramo de atividade estejam.
[fim da transcrição]
Todos os equívocos relacionados a falta de produtividade no ambiente de trabalho (lembrando que a palavra "produtividade" é um tabu para muita gente no setor cultural), apontados no trecho transcrito da entrevista, são um espelho fiel da maioria dos ambientes de trabalho relacionados a produção executiva de qualquer atividade cultural. Há muitos motivos para isso. Dois deles, para mim, são os que mais prejudicam. Vamos lá.
Cargos de direção de produção, produção executiva e coordenação de projetos sendo ocupados por pessoas sem preparo, pouca experiência e submetidas a grandes tensões
Passei por isso ano passado. É uma situação muito complexa. Direção, suporte a processos de trabalho ou coordenação de equipes significa orientar o trabalho de várias pessoas, motivar as pessoas, ajudá-las a dar o melhor si, a exercerem suas competências. Como alguém que sequer conhece a equipe e sequer faz qualquer movimento no sentido de entender quem é o grupo com o qual trabalha pode estimular alguém? Como alguém pode dar o melhor de si, se o seu superior hierárquico o tempo todo empurra com a barriga processos de trabalho e justifica dizendo "gente, vamos afinando o processo" ou "é um projeto novo"?
Sugestão: prever no orçamento dos projetos (alô Ministério da Cultura, esteja aberto para inclusão disso nos projetos via lei Rouanet, audiovisual e editais em geral) recursos para alguém trabalhar com a gestão de pessoas (antigamente conhecida como RH). Assim, mesmo tendo gestores sem preparo, existirá alguém que poderá ajudar a pensar os processos de trabalho e trabalhar para melhoria das condições de trabalho.
Falta de definição dos papéis de cada um no ambiente de trabalho
Estudos sobre o sofrimento do trabalhador apontam a forma como o trabalho é organizado como um dos principais fatores. Vou mais além: tenho certeza que a organização "caótica" do trabalho tem levado muita gente a ter doenças ocupacionais, tais como a depressão. Agora imaginem: existem atualmente no Brasil pessoas "louvando" a desorganização, achando que o bacana dos novos tempos no setor cultural é a o movimento dos desorganizados. Isso é bacana para quem optou realizar ações culturais apenas com o objetivo de fruição de seus direitos culturais. Quem trabalha com arte, comunicação, cultura e entretenimento e tira o seu sustento desta atividade, sabe o quanto é importante ser organizado.
Sugestão: que se pense e planeje o papel de cada um num projeto, ao invés de apenas nomear funções e pensar num valor para uma planilha de orçamento a ser encaminhada para um edital.
Sinceramente, bom é trabalhar com organização. A arte, a cultura e a nossa qualidade de vida agradecem.
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* Alexandre Barreto, mais conhecido como “Alê Barreto”, é um profissional multifuncional. Administrador de empresas, diretor de produção e produtor executivo, possui competências tanto para organização de eventos e direção de produção como para planejamento, gerenciamento e execução de projetos culturais, sociais e corporativos. Sua ação pioneira de compartilhar suas experiências práticas têm contribuído para a organização e desenvolvimento de setores criativos brasileiros. Criador do blog “Produtor Cultural Independente”, ativo desde 2006, possui diversos textos citados e recomendados em publicações do SEBRAE e em trabalhos de graduação e pós-graduação.
Seu livro "Aprenda a Organizar um Show", primeiro método sobre produção executiva de shows publicado em língua portuguesa na internet, já foi acessado por mais de 22.000 pessoas e rendeu-lhe convite para cursos, palestras e consultorias em várias cidades do Brasil e a indicação em 2013 ao Prêmio Dynamite de Música Independente (SP).
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