quarta-feira, novembro 05, 2008

Culturas brasileiras no mundo: Do país do samba e da caipirinha a um pólo de inovações culturais contemporâneas



Artigo de Ana Carla Fonseca Reis e George Yúdice publicado originalmente na revista argentina Nueva Sociedad

Embora a imagem tradicional do Brasil no mundo seja projetada a partir da caipirinha, do samba e do futebol, na realidade existe muito mais. A enorme diversidade cultural do país tem permitido uma longa série de inovações, algumas alentadas pelo Estado e outras surgidas de maneira espontânea, que contribuem para uma imagem menos estereotipada do Brasil.

Das novelas ao AfroReggae, das novidades da internet à São Paulo Fashion Week, o desafio consiste em articular, a partir do governo, os projetos e iniciativas dispersos a fim de explorar um dos grandes capitais do Brasil: sua diversidade cultural.

País de contrastes sociais, de distâncias econômicas abissais, de diversidade cultural pujante e de natureza ímpar. Para orgulho dos locais, quem visita se encanta, quem conhece não se esquece, conforme constatam pesquisas oficiais. Mas, para visitar e conhecer, é preciso ir além da imagem de samba, futebol e caipirinha, reducionista por excelência de um colosso cultural e que não revela o dinamismo das várias faces da cultura brasileira no palco mundial. A favor da ampliação desse ponto de vista, há uma miríade de inovações culturais paralelas e sobrepostas, que estabelecem pontes entre o Brasil e o exterior, formando uma rede de diálogos contagiante e de envergadura exponencial.

Para abordar estas e outras questões, o presente artigo apresenta três seções: primeiro, um panorama da imagem e da presença da cultura brasileira no exterior (ou das culturas, tendo em vista seu horizonte de diversidade), analisando brevemente a que ponto os retratos do Brasil formam ou não um filme próprio, ao invés de imagens dispersas; diante disso, aprofundar em seguida os caminhos pelos quais um caldeirão de experiências inovadoras consegue levar o local ao global, muitas vezes trazendo o global na bagagem de volta e vice-versa; e, por fim, algumas elucubrações acerca de como novos caminhos tenderão a se desenhar.

Começando: retratos do Brasil
Como a cultura de um país galga fronteiras físicas, emocionais e burocráticas? Como o mapa mental cultural das pessoas amplia-se com o conhecimento da cultura de um país, configurando um novo perímetro emocional
individual na dinâmica mundial? As respostas são múltiplas, mas atenhamo-nos a quatro:
- pelos imaginários relativos à sociabilidade e à violência, na música, no cinema e nos noticiários internacionais;
- por meio dos turistas de lazer ou negócios, que se convertem em embaixadores privilegiados dos lugares que visitam;
- pela circulação internacional dos bens e serviços culturais e das tradições locais, adquiridas ou vivenciadas no exterior, física ou digitalmente; ou ainda por meio de notícias do Brasil veiculadas em outros países;
- graças à circulação dos brasileiros, em trânsito ou residentes no exterior, que invariavelmente divulgam sua cultura por seus relatos, atitudes e hábitos.

Sociabilidade e violência. O Brasil é um país-continente, de uma enorme variedade de territórios e culturas. Recorrê-lo e retratá-lo gera uma contraditória colagem, algo como uma colcha de retalhos. Talvez a imagem mais espetacular seja Brasília, hipermoderna «cidade do futuro», como a chamou o crítico de arte Robert Hughes1 e Patrimônio Cultural da Humanidade (UNESCO, 1987) que não representa o passado, mas um projeto de futuro. Face à perda das tradições culturais pelo embate da televisão, o protagonista mais bem-sucedido do filme Bye-Bye Brasil (1979), o acordeonista Ciço, reconverte o forró, tradição do nordeste, fusionando-o com o rock, para entreter os candangos na cidade-satélite onde acabou morando. Poucos anos depois, a informalidade acumulada nesses satélites ameaça a ordem dessa modernidade utópica, ou, nas palavras de uma reportagem do The New York Times2, o «Brasil real» demonstrou a insustentabilidade desse pulo desenvolvimentista ao futuro.

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