sexta-feira, julho 18, 2008

Cultura não dá voto

Entrevista de Marco Antônio Carvalho Teixeira para Juliana de Sordi Gattone, publicada originalmente no site do Diário do Grande AB em 12/07/08


Marco Antônio Carvalho Teixeira, cientista político especializado em administração pública, apresenta uma análise sobre a falta de investimentos em Cultura: por não proporcionar obras materiais, é colocada em último lugar no ranking de prioridades. "Não investe porque não vira obra, embora seja ganho imaterial fantástico."

A avaliação é cruel, mas evidencia a realidade não só do Grande ABC, mas de boa parte do País. Ele cita como exemplo o orçamento da União, no qual a Cultura recebe apenas o residual das demais rubricas.

O analista rechaça a teoria de que não há interesse dos governantes em proporcionar cultura aos eleitores. Para ele, isso é um mito e tem mais relação com a questão da alfabetização.

Como a prioridade dos administradores passa por áreas mais críticas, como Saúde, Educação e Segurança, Teixeira sugere a eles que façam a interface da Cultura com outras áreas cujas atividades são similares.

Para o cientista político, há iniciativas viáveis sem a necessidade de investimentos exagerados, como parcerias e oficinas.

Marco Antônio Carvalho Teixeira acrescenta que investir em eventos como rodeios e outros com perfil massificado, por exemplo, é uma forma míope de tratar a Cultura.

DIÁRIO - Historicamente, como os políticos lidam com a Pasta de Cultura no Brasil?

TEIXEIRA - Cultura sempre foi considerada uma área secundária, tanto em termos de orçamento como de propostas. Dificilmente, um político vai a público discutir projetos para a área. Outro fator é que os próprios partidos políticos que forneceriam dados para o governo não o fazem. Os meios culturais têm pouca atenção do setor político e pouca projeção e capacidade de pressionar, por isso, ficam com as sobras dos recursos.

DIÁRIO - Por quê?

TEIXEIRA - Tem demandas muito mais emergentes, sobretudo as sociais, e as escolhas são preponderantes. Mas optar por outras áreas não tiraria a possibilidade de dar atividades, com cardápio variado à população por meio de acessos a shows e outras atividades não muito onerosas. Oficinas culturais, atividades em escolas e ações casadas entre Cultura e Turismo, Cultura e Educação ou Cultura e Desenvolvimento são saídas honrosas. Talvez, os governantes devem pensar Cultura como algo intersetorial, para dialogar com várias setores. Esses exemplos que citei são interfaces possíveis, há enormes similaridades entre essas áreas, que muitas vezes têm seus papéis

DIÁRIO - Alguns administradores optaram em unir as pastas que o sr. citou, mas são acusados de utilizarem os investimentos em Cultura para a área unificada.

TEIXEIRA - O grande problema é quando é aplicado só o mínimo. Excluindo o que não se pode fazer, o político pode fazer outras coisas. E não adianta se não tiver pessoa com capacidade, se for um cargo meramente de indicação política.

DIÁRIO - Por que há essa resistência em aumentar o valor do orçamento para a área?

TEIXEIRA - Via de regra, isso acontece em todo o lugar. No orçamento federal, Cultura também recebe verba residual. Talvez porque a Cultura não dê voto, não aparece tanto. A Cultura aparece mais em rodeios, atividades massificadas. E tratar o setor apenas com essas ações é ver a área de maneira míope, sem lidar com a questão de valores e tradição. Algumas iniciativas que têm parcerias com o poder público podem trazer resultados fantásticos. São nelas que se descobrem talentos escondidos, de pessoas que não teriam a possibilidade de aprender a tocar um instrumento, a pintar. Veja a orquestra da Favela do Heliópolis, por exemplo. Ganhou notoriedade pela qualidade dos músicos que descobriu.

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